A FILAC AO 2027
MUDANÇA COM SABEDORIA: DEFINIÇÕES E DIRETRIZES ESTRATÉGICAS
PARA O PERIODO DE 2017 A 2027
MAIO DE 2017
Os países da comunidade internacional valorizaram o processo de Reengenharia da FILAC e concordaram com a Recomendação nº 32 da XVI sessão do Fórum Permanente da ONU sobre questões Indígenas, como segue:
“32. O Fórum Permanente toma nota do trabalho do Fundo para o Desenvolvimento dos povos Indígenas da América Latina e do Caribe (FILAC) como mecanismo de apoio regional aos Povos Indígenas. O Fórum Permanente encoraja os Estados membros a fortalecerem a institucionalidade do FILAC e a criarem corpos semelhantes em outras regiões do mundo.
CONTEÚDO
3 Considerações iniciais e de contexto
3.1 Principais tendências e incertezas do ambiente local, regional e global
3.3 Cenários futuros a serem considerados
3.4 Desafios de uma nova etapa
4. Bases normativas e institucionais do FILAC
5. Definições estratégicas do FILAC.
6.1 Agenda de Mudança Estratégicas do FILAC
6.2 Objetivo e resultados-chave a serem alcançados
6.3 Mapa Estratégico e Cadeia de valores do FILAC para o 2027
6.4 A rede de relacionamentos e função de articulação do FILAC
7 Programas emblemáticos e Eixos estratégicos
7.1 As linhas de programas e/ou programas emblemáticos.
7.1.1 O Programa de Diálogo e Concertação
7.1.3 O Programa de Educação de Patrimônio
7.2.1 O posicionamento institucional do FILAC
7.2.2 Desenvolvimento da assistência técnica e da formação política
7.2.3 Geração de financiamento de projetos e programas emblemáticos
7.2.4 O financiamento das operações do FILAC
7.2.5 Desenvolvimento estratégico e organizacional
- Estrutura e modelo de gestão
1 Apresentação
Este documento desenvolve as diretrizes estratégicas gerais de acordo com as quais o FILAC orientará as suas ações político-programáticas e dará forma às suas instituições nos próximos 10 anos, no período entre o 2017 e o 2027. Constitui um roteiro com os marcos fundamentais que traçam o caminho a ser seguido, de modo que o FILAC possa organizar os seus recursos humanos, técnicos e financeiros, otimizando a realização dos objetivos e a finalidade para a qual foi criado.
No entanto, não deve ser entendido como um conjunto de preceitos e diretrizes constituído duma vez por todas. É um gráfico estratégico de navegação que, sem abandonar as nossas declarações fundamentais, propõe uma forma de organizar os nossos recursos e priorizar e organizar as nossas operações para atender aos desafios do presente e do futuro, e estará sujeito a adaptações e ajustes sempre que seja oportuno e pertinente.
O conteúdo desenvolvido neste documento é resultado das deliberações e do processo de trabalho e do relançamento institucional em que o FILAC está engajado desde o 2013, e especialmente desde que a XII Assembleia Geral da FILAC aprovou as diretrizes de reengenharia (Resolução nº 2).
Estes conteúdos foram sistematizados pela Secretaria Técnica com a assistência e a participação duma equipe de suporte técnico, resultando num documento de discussão que foi discutido e finalmente adotado pelo Conselho de Administração no âmbito dum seminário de Planeamento Estratégico, e a sua sessão LX, realizada nos dias 12 e 13 de maio de 2017, respetivamente, em Santiago, no Chile.
2 Antecedentes
A X Assembleia Geral do FILAC resolveu implementar um processo de “relançar a organização” […] “fortalecer a sua institucionalidade e reforçar o seu impacto[1]“, bem como “garantir a sua capacidade de responder às agendas dos povos indígenas, garantindo as condições do seu funcionamento e do cumprimento do seu papel como facilitadores do diálogo e da formação de consenso entre os atores do desenvolvimento indígena[2]”
A X Assembleia Geral também concordou que a revisão do projeto e operação do FILAC deve estar relacionada a três aspetos centrais:
- Atualização a conceção das estratégias institucionais, que devem funcionar com as relações em mutação entre os Estados, os povos e a cooperação ao longo de vinte anos;
- Modernização e reforço da estrutura operacional; y
- A renovação do pacto entre os principais atores do FILAC, em torno do respeito e da implementação dos direitos já reconhecidos, e a favor da adoção duma agenda compartilhada para gerenciar o desenvolvimento com identidade visando à obtenção duma boa vida.
Em conformidade com o artigo 3.º da Resolução n.º 1 da X Assembleia Geral que declarou ao FILAC “o Patrimônio dos Povos Indígenas e dos Estados da América Latina e do Caribe”, o FILAC promoveu um processo participativo de consulta sobre as expetativa e agendas dos diferentes atores do mundo indígena em relação ao papel do FILAC no novo contexto internacional.
Posteriormente, a Assembleia do FILAC, reunida em sessão especial em 2013, pela Resolução 04/2013, concordou “em aprovar a proposta de relançamento do FILAC, como um contributo para a elaboração dum processo que toma como base o pleno exercício dos direitos dos povos indígenas, a livre determinação, o consentimento prévio, livre e esclarecido, a ratificação da Convenção 169 da OIT, a inclusão e a participação de mulheres indígenas, o fortalecimento dos governos locais e a implementação de ações destinadas à revitalização das culturas” (Artigo Primeiro)
Desde então, no âmbito de numerosas reuniões e atividades[3], os atores do FILAC estão comprometidos com a tarefa de avaliar com uma abordagem formativa o trabalho institucional, construindo visões e um entendimento compartilhado sobre os desafios que tiveram de ser enfrentados para reforçar a sua capacidade de influenciar o presente e o futuro dos Estados e a capacidade dos povos indígenas de exercerem e gozarem dos direitos reconhecidos através de instrumentos como a Convenção 169 da OIT e a Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas, e os desenvolvimentos regulamentares adotados pelos países e os Estados-Membros[4].
Posteriormente, o Órgão Consultivo Indígena e o Órgão Consultivo Intergovernamental, em preparação para a XII sessão ordinária da Assembleia Geral, aprenderam a proposta e a avaliaram favoravelmente, emitindo recomendações para enriquecer o seu conteúdo.
Finalmente, por ocasião da sua XII sessão ordinária, realizada em Bogotá nos dias 16 e 17 de julho de 2015, a Assembleia Geral decidiu aprovar a proposta “Diretrizes para a reengenharia do FILAC” … “como um documento básico que servirá para um relançamento real e eficaz do FILAC” (Resolução nº 2)
Os conteúdos preparados pelas partes integrantes e os parceiros interessados do FILAC durante todo este trabalho e processo de desenvolvimento institucional foram sistematizados pela recém-assumida Secretaria Técnica, com a colaboração duma equipe técnica de excelência, levando a um documento de discussão que foi discutido, enriquecido e finalmente adotado pelo Conselho de Administração no âmbito de um Seminário de Planeamento Estratégico, e a sua sessão LX, realizada nos dias 12 e 13 de maio de 2017, respetivamente, em Santiago, no Chile.
3. Considerações iniciais e de contexto
3.1 Tendências e incertezas chaves do ambiente local, regional e global[5]
Existem vários processos nos níveis regional e global que constituem o contexto no qual as operações do FILAC devem ser projetadas e executadas, que condicionam essas operações, estabelecendo novos horizontes de significado para o trabalho o FILAC e desafiando a relevância e a pontualidade das suas ações; propor desafios e oportunidades que precisam ser levados em conta na elaboração dum gráfico de navegação estratégica para os próximos dez anos:
- A crise global. Abordar os processos e problemas que atualmente desafiam a humanidade e os povos indígenas, como a crise ambiental e as mudanças climáticas, os fundamentalismos, a guerra e os processos migratórios em grande escala, exigem problemas, esforços e recursos. Ao mesmo tempo, abordar esses problemas globais desafia o respeito e a proteção dos direitos dos Povos Indígenas[6].
- A democracia posta à prova. Devido à intensificação das interações e à natureza transnacional destes processos, ao diálogo do conhecimento, à circulação de conhecimentos epistemicamente diversificados, à crise, mas também à reinvenção da democracia por parte dos movimentos cidadãos amplos, os modelos de governança dos Povos Indígenas e a auditoria eleitoral dentro dum fenômeno de fortalecimento do cidadão e gestão do conhecimento para o “empoderamento democrático dos Estados”.
- o reconhecimento de direitos. Depois dum longo caminho de luta pelo reconhecimento como povos indígenas e os seus direitos inerentes, consubstancias, foram realizados avanços significativos neste domínio a nível regional e global[7], sendo a criação do FILAC é uma dessas conquistas. Com todos os problemas e dificuldades, foram feitos progressos. No entanto, existe uma enorme lacuna entre padrões e desenvolvimentos regulatórios e a sua implementação no nível local e comunitário, no exercício dos direitos.
Temos de ter expressões concretas sobre a forma como estas mudanças são alcançadas a nível local e comunitário, no exercício dos direitos.
- Modelo de desenvolvimento. Até há algum tempo, não havia conversa sobre desenvolvimento com identidade. Tivemos os últimos 20 anos mudanças importantes: embora tenha havido alguma redução na pobreza, o crescimento econômico aprofunda a desigualdade com base num modelo extrativo que, com a queda no preço dos bens consumíveis e outros fatores, se torna mais complicada, com o aumento subsequente da pressão sobre os recursos territórios[8] dos povos indígenas. Neste contexto, a questão dos direitos humanos é ainda mais agravada pela criminalização do protesto social, pela pressão sobre os recursos, pela utilização da força, pela imposição de alternativas e pelas prioridades de desenvolvimento em relação às visões e estratégias próprias dos povos indígenas.
- A cooperação para o desenvolvimento. Quando o FILAC nasceu, parecia que a cooperação para o desenvolvimento tinha uma dinâmica que duraria para sempre. No entanto, essa tendência mudou devido a vários fatores. A cooperação bilateral e multilateral continua a funcionar nos países da região, mas está a financiar projetos maiores e mais abrangentes e menos projetos pequenos. E não há organizações indígenas capazes de canalizar esses volumes de recursos, nem agem como intermediários para essas operações. Nesse contexto, o FILAC é chamado a rever suas práticas, o escopo e o foco das suas operações, a fim de se tornar um dos principais beneficiários desses fundos de cooperação, considerando-se, ao mesmo tempo, a coleta e a gestão dos recursos nacionais. De forma complementar, o FILAC pode contribuir para o reconhecimento e institucionalização das formas organizacionais e normas próprias dos povos indígenas para a gestão da cooperação; capacitá-los para gerenciar e administrar a cooperação; e ser reconhecido dessa forma por ele, e superar a tecnocracia que impõe barreiras e intermediários com exigências e padrões irrelevantes.
- Mudanças na filantropia. Grandes ONGs estão deixando a região, concentrando os seus recursos nos seus clientes regulares. A maior parte dos recursos canalizados para a América Latina é recebida e gerida por ONGs não indígenas. Nesse cenário, o FILAC poderia se tornar um facilitador para garantir que os fundos sejam canalizados através dos povos indígenas, e como um grande recetor de fundos, como uma identidade que poderia convocar doadores privados, e, ao mesmo tempo, desenvolver a capacidade dos povos indígenas de receber e gerenciar esses recursos de maneira autônoma e transparente.
- As modalidades organizacionais e a necessidade de novas formas de concertação no espaço global. Durante muito tempo, a tendência era formar ONGs para canalizar recursos de cooperação para fazer o que o Estado não fez. Hoje, a sociedade civil está se articulando em plataformas globais para resolver problemas que são globais. Há uma multiplicidade de formas de organização e de alianças, que mudaram as formas de organização dos povos indígenas nos últimos 25 anos, o que exige que o FILAC considere como ela vai se relacionar e trabalhar, projetando e considerando iniciativas e modalidades de concertação relevantes para levar em conta essas novas expressões organizacionais[9].
- Novas tendências sociodemográficas. A migração é um fenómeno óbvio, associado à expulsão dos territórios ancestrais por pressão sobre os recursos naturais e à tentativa de ser incorporada no mercado; e, então, a urbanização de grandes contingentes da população indígena, fazendo com que, no presente, uma grande população indígena resida em ambientes urbanos. Por outro lado, em muitos povos indígenas, a maioria da população tem menos de 25 ou 30 anos de idade. Há uma transição demográfica e estamos a viver mais tempo, mas a maior parte da nossa população é jovem, e isso deve ser considerado.
3.2 Evolução do contexto regional e dos ciclos institucionais
Os vínculos históricos e as tensões entre os principais atores institucionais e sociais, bem como os contextos nacionais e internacionais em que atuaram, determinaram a existência de estágios ou ciclos de operação do FILAC que devem ser brevemente revistos.
O primeiro ciclo surge do projeto inicial do FILAC, que se baseava na compreensão das relações entre povos indígenas, os Estados e a cooperação internacional caraterizada pela dinâmica de emergência dos povos indígenas, pela reforma neoliberal do Estado e pelas mudanças na cena internacional no quadro da globalização.
Nesta fase de fundação, que durou até o ano 2000, detetamos o surgimento e a consolidação de organizações de comunidades e povos indígenas nos países da região, com fortes demandas por direitos e desenvolvimento, A resposta de alguns governos na modificação das políticas indígenas tradicionais para a introdução de certas mudanças legais e institucionais relacionadas ao tratamento das questões dos povos indígenas. Ao mesmo tempo, as agências de cooperação preocupam-se em colocar os seus recursos de forma mais direta e eficaz dentro dos objetivos definidos pelos próprios beneficiários.
O Fundo foi concebido como facilitador de ações em torno de quatro linhas de ação: o desenvolvimento de direitos, a geração de capacidades de gestão, a identificação e preparação de projetos de desenvolvimento e a promoção da consulta entre as partes. A principal estratégia era formar um portfólio de iniciativas específicas que as organizações indígenas consideravam essenciais para o seu próprio desenvolvimento e para as quais desejavam obter recursos financeiros e assistência técnica.
O segundo ciclo ou a maior fase do FILAC coincide com o início do século XXI e foi caraterizada por mudanças muito importantes no cenário das interações entre os povos indígenas, os Estados e a comunidade internacional. Em particular se destaca o estabelecimento do Fórum Permanente das Nações Unidas sobre questões Indígenas (2000), bem como a nomeação dum Relator especial (2001) e dum Mecanismo de Peritos sobre os Direitos dos Povos Indígenas (2007), ambos dependentes do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, e, em particular, a adoção da Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas em 2007. Esses marcos, entre outros, marcaram o ponto mais alto do desenvolvimento da plataforma internacional sobre os direitos dos povos indígenas; e lançou uma série de processos ao nível global, envolvendo a dinâmica das organizações e movimentos indígenas, o ajuste das políticas estaduais e o papel das agências internacionais de cooperação. Ao mesmo tempo, há um intenso desenvolvimento legislativo sobre os direitos indígenas, que incluiu a aprovação de novas constituições com avanços significativos na matéria, como foi o caso do Equador (2008) e da Bolívia (2009).
Nessa fase, o FILAC adotou uma estratégia de trabalho mais pró-ativa do que reativa, mais focada na oferta institucional do que na demanda indígena. Foram envidados esforços para apoiar os esforços dos povos indígenas para formular os seus próprios planos de desenvolvimento, fortalecer e institucionalizar as atividades de formação e capacitação, estabelecer mecanismos institucionais de informação e comunicação, identificar novas formas de atrair recursos e desenvolver ferramentas administrativas para facilitar as operações da Secretaria Técnica e tornar visíveis os impactos da gestão. A estratégia centrou-se na preparação e implementação de programas de referência relacionados com a formação de quadros de alto nível; desenvolvimento com identidade; comunicação e informações; concertação, e; mulher indígena.
Após um período de mudanças e ajustes institucionais, o FILAC entrou num terceiro ciclo, herdeiro dos processos anteriores, mas que, ao mesmo tempo, marcará as suas próprias identidades à luz duma nova realidade para os povos indígenas da região e as suas relações com os Estados e a sociedade como um todo.
Este período é marcado pelas tensões que caraterizam a relação Estado–Povos Indígenas, particularmente no que se refere à efetiva implementação dos direitos individuais e coletivos reconhecidos no período anterior, mas que não necessariamente acabam sendo realizados da maneira desejada, com particular atenção às formas como os povos e as comunidades indígenas participam na vida política e social. Como corolário disso, a perceção e a prática diária da transição do multiculturalismo para a interculturalidade social são uma tarefa pendente, com vários estágios de progresso, mas em todos os casos longe de ter sido consolidada.
Nesse nível, os povos indígenas estão avançando com grande força um novo paradigma alternativo para o conceito de desenvolvimento relacionado ao crescimento econômico, identificado com a noção de Sumak Kawsay ou Bom Viver. No auge desta exigência da época, o FILAC redefiniu a sua missão, entendendo-a como a promoção da vida boa (Sumak Kawsay), como alternativa da vida digna para os povos, nacionalidades e comunidades indígenas da América Latina e do Caribe, através do pleno exercício dos direitos humanos e coletivos e da interculturalidade.
Esta nova etapa inclui como objetivo essencial a colocação dos direitos e perspetivas indígenas no centro das preocupações dos Estados e dos atores sociais da região.
Tanto os novos projetos estratégicos como a estrutura operacional devem estar em sintonia com esse conceito, para o qual a renovação dos acordos com organizações indígenas, instituições estatais e cooperação internacional será um instrumento fundamental. Nesta fase, com base na sua rica experiência, o FILAC terá como objetivo não apenas oferecer e implementar programas, mas também facilitar interações e prestar serviços à região dentro das suas áreas de possibilidades de trabalho e recursos.
3.3 Cenários futuros a serem considerados
A criação e a existência do FILAC fazem parte do esforço e da tendência de gerar condições para a relação e gestão de questões de interesse comum, entre atores sociais, públicos e privados, que ao longo da história mantiveram mais desacordos e tensões do que acordos.
Em termos gerais, pode dizer-se que as tensões dizem respeito a determinados aspetos centrais.
Por um lado, em virtude dos processos políticos e sociais que se têm lugar nos Estados.
A construção de sociedades interculturais, não só pelo mandato das normas internacionais e, em muitos casos, pelas normas constitucionais de vários países da região, mas sobretudo pelas exigências da sociedade, enfrenta necessidades urgentes. Estes incluem a conclusão dos processos de descolonização, do desmantelamento de estruturas racistas e discriminatórias, da expansão e do reforço dos sistemas democráticos, incorporando firmemente os direitos coletivos dos povos indígenas, além das mudanças de política institucional e pública que realmente incorporam uma atenção determinada às demandas dos povos originários.
Ninguém pode conceber que as sociedades estão a avançar na direção certa a favor do reconhecimento e da implementação dos direitos. Infelizmente, a realidade quotidiana nas Américas e em todo o mundo mostra-nos inúmeros exemplos de retrocessos sobre questões que pareciam ter sido superadas, de contradições entre declarações e ações, de posições contrárias a sociedades inclusivas e tolerantes que ainda têm peso na tomada de decisões políticas. Ao mesmo tempo, a dinâmica social implica a inclusão de novos temas, de novas perspetivas que forçam as instituições e organizações sociais a não se manterem indiferentes a elas. A vasta gama de exigências relacionadas com a diversidade, a mobilidade humana, as respostas alternativas aos problemas sociais são alguns exemplos disso.
Por outro lado, dentro das mesmas organizações indígenas e sociais dos países da região, também há mudanças e contradições, caraterísticas de qualquer sociedade democrática, que muitas vezes envolvem posições críticas do Estado, entidades internacionais e, em geral, os atores com poder para tomar decisões vinculativas. Não é segredo para ninguém que isso implique posições internas críticas sobre a participação em espaços acordados com representantes do Estado, a nível nacional ou regional, ou promover resultados mais profundos e imediatos nessas áreas.
Na medida em que, por qualquer motivo, sejam perspetivas políticas, requisitos de eficiência dos recursos ou qualquer outra razão, possam existir diferenças nas perceções ou na substância ou forma que, sem serem aspetos com um nível de significância comparável aos pontos anteriores, eles não deixam de gerar consequências sobre instituições como o FILAC, que tem um importante vínculo com essas áreas.
Levando em consideração esses aspetos, o planeamento deve prever possíveis cenários menos favoráveis para o desempenho institucional do FILAC, tanto no seu funcionamento interno quanto, em particular, em relação às três áreas externas mencionadas acima.
Neste sentido, parece necessário começar pela base de que a conformação de paridade da instituição e a adesão dos Estados da região e alguns aspetos extrarregionais, são aspetos positivos e de identidade que podem desempenhar um papel anti cíclico face a algumas dinâmicas potencialmente negativas.
Considerando essa vantagem comparativa, parece apropriado fornecer como componente permanente do trabalho institucional, a cuidadosa observação das tendências nacionais e regionais que, de alguma forma, podem gerar tensões com os princípios de ação do FILAC, pois, em devido tempo, avaliar a relevância de influenciar duma forma ou de outra em favor dos acordos conceituais fundamentais.
3.4 Os desafios duma nova fase
O Fundo para o Desenvolvimento dos Povos Indígenas da América Latina e do Caribe foi criado na II Cúpula Ibero-Americana de Chefes de Estado e de Governo realizada em Madri, Espanha, em 1992, com o objetivo de apoiar os processos de autodesenvolvimento dos povos, as comunidades e organizações indígenas da região, reconhecendo a natureza integral dos seus territórios, os seus direitos e as suas caraterísticas socioculturais.
Vinte e cinco anos após a criação do FILAC as condições que inspiraram o seu nascimento foram significativamente modificadas, com interações mais complexas e multidirecionais devido ao aumento do número e da variedade de atores no palco, cujas regras do jogo também foram desenvolvidas como resultado do grande número de instrumentos normativos nacionais e internacionais adotados.
No entanto, apesar das mudanças legais positivas, a região continua a mostrar a ausência ou, no seu caso, a debilidade profunda das políticas públicas inclusivas e interculturais, sendo que a pobreza, a marginalidade e a exclusão noras de identificação da realidade da América Latina.
Assim, o FILAC enfrenta essa nova etapa com o desafio de ajudar a reduzir/fechar as lacunas causadas pela heterogeneidade estrutural, vulnerabilidade externa e persistência de altos níveis de desigualdade, onde os povos indígenas estão entre os grupos mais desfavorecidos que sofreram de práticas discriminatórias persistentes até o momento, que envolveram uma desapropriação sistemática dos seus territórios, com graves consequências para o seu bem-estar[10].
Se nos atemos à perceção majoritária daqueles de nós que somos membros do FILAC e especialmente, apoiados pelo diagnóstico e pelas propostas desenvolvidas no processo de promoção da reengenharia da instituição[11], é essencial adotar profundas mudanças que nos permitam superar os problemas atuais e ao FILAC uma poderosa estrutura institucional para realizar as suas tarefas fundamentais.
Nesse sentido, as mudanças institucionais devem incluir, pelo menos, os seguintes aspetos:
- O FILAC precisa duma profunda mudança na sua cultura e clima organizacional que deva se basear em conceitos essenciais, como uma estrutura organizacional adequada, uma melhor organização dos seus postos de trabalho, funções e competências, visando o objetivo principal de fornecer serviços de qualidade com resultados concretos e mensuráveis.
- Tal como o dito no documento acima referido, não é possível pensar em tais modificações fundamentais imediatamente e sem tensões, mas é necessário enfrentar os desafios que podem envolver a correção das disfunções, mas também destacar os aspetos positivos existentes para leva-as a cabo como práticas de promoção.
Para que isso seja possível, foi iniciada uma profunda reestruturação da Secretaria Técnica do FILAC, que inclui a recente nomeação dum novo Secretário Técnico, mas que deve abranger outros aspetos administrativos, de gestão e de recursos humanos.
Entre outras coisas, é uma questão de fazer os ajustes apropriados para formar uma entidade mais organizada, com uma orientação técnica e administrativa eficaz para alcançar uma gestão sólida e orientada para os resultados.
Envolve também melhorar o modelo organizacional que permite a atribuição e distribuição de funções de forma coerente, bem como assegurar uma coordenação adequada e o fluxo de informação institucional.
- Outro aspeto essencial é a otimização dos processos de busca e obtenção de recursos, bem como o uso deles. Conforme ao indicado no diagnóstico acima, é necessário realizar um controle austero e detalhado das despesas, com um sistema de auditorias que forneça as informações necessárias em tempo e forma.
A sustentabilidade financeira da instituição, bem como o desempenho transparente e eficiente, devem ser o objetivo a alcançar.
- A busca de transparência e responsabilidade são outros aspetos relevantes, pois constituem uma condição fundamental para o estabelecimento e manutenção de relações cooperativas baseadas na confiança, dentro dum órgão como o FILAC cujo trabalho envolve a participação conjunta dos seus atores constituintes.
Por conseguinte, é necessário promover uma política explícita e sistemática de aplicação dos mais elevados padrões de transparência e de responsabilização, a fim de submeter as suas ações ao conhecimento e ao controlo públicos e às suas partes interessadas, a fim de otimizar a sua gestão, e informar as decisões a serem tomadas pelos atores indígenas e governamentais que são parte integrante da instituição.
Essas e outras mudanças relevantes desenvolvidas ao longo deste documento podem ser alcançadas a partir dum forte consenso institucional sobre a caraterização da etapa, os objetivos a serem alcançados e, além disso, os ajustes organizacionais e administrativos que são concebidos funcionais para esses objetivos.
A profundidade dos problemas enfrentados diariamente pelos povos indígenas dos nossos países não admite o menor atraso no processo de fortalecimento do FILAC para que possa cumprir adequadamente o mandato para o qual ele foi criado. Esse é o compromisso que a nossa instituição assumiu no âmbito do processo de Reengenharia Institucional.
4. Políticas e bases institucionais do FILAC
Embora tenha sido inicialmente criado como um programa para a II Cúpula Ibero-Americana, em 2006, os Chefes de Estado e de Governo que participaram da XVI Cúpula Ibero-Americana em Montevidéu, no Uruguai, decidiu-se apostar na consolidação do FILAC como a única organização internacional especializada na promoção do Desenvolvimento com Identidade focada na Boa Vida – no Viver Bem dos Povos Indígenas, bem como no reconhecimento dos seus direitos individuais e coletivos[12].
Em outubro de 2016, a Assembleia Geral, embora tenha concordado em manter o nome oficial da organização, decidiu alterar o nome ou o acrônimo da organização para “FILAC” (Fundo Indígena Latino-Americano e do Caribe), ao mesmo tempo em que decidiu promover uma campanha de visibilidade institucional usando o novo acrônimo como nome como denominação para o efeito da comunicação institucional[13].
Em termos da sua natureza jurídica, a legislação vigente considera o FILAC um Órgão internacional de Direito público cujos órgãos de governo e operação se baseiam na igualdade de relações entre Estados e Povos Indígenas[14].
O Convénio Constitutivo na sua redação dada pela recente alteração, preveem que, para cumprir os seus objetivos, o mesmo tem as seguintes funções:
- Servir de mecanismo de diálogo intercultural e de consulta com o objetivo de apoiar os processos de autodesenvolvimento dos povos indígenas.
- Ajudar e promover como aliado dos Estados, para a formulação de políticas públicas em benefício dos Povos Indígenas, visando apoiar os processos de autodesenvolvimento conhecidos como a Boa Vida – o Viver Bem dos povos.
- Gerenciar, canalizar e administrar os recursos financeiros e técnicos para os projetos e programas prioritários, garantindo que contribuam para a criação das condições para o autodesenvolvimento dos Povos Indígenas.
- Respeitar, promover, impulsionar e implementar os direitos econômicos, sociais, culturais, políticos e ambientais dos povos, comunidades e organizações indígenas da América Latina e do Caribe, doravante denominados “Povos Indígenas”[15].
É importante notar que, além de alguns ajustes feitos nos parágrafos a, b e c, a partir de 2016, são expressamente incluídos como funções do FILAC o respeito e a promoção dos direitos dos povos indígenas da América Latina e do Caribe.
De acordo com essa linha de ajustes normativos internos, devemos destacar a alteração feita no preâmbulo dos artigos de acordo, que inclui o seguinte texto:
“Tendo em conta os compromissos assumidos com a adoção da Declaração da ONU sobre os Direitos dos Povos Indígenas em 2007; outros instrumentos internacionais, e o documento final adotado pela Conferência Mundial sobre os Povos Indígenas, realizada em setembro de 2014 na ONU, organizada pelos respetivos Estados”.
Se esta legislação for analisada de forma abrangente, deve-se concluir que a natureza jurídica do FILAC se baseia e promove a igualdade de relações entre Estados e Povos Indígenas no âmbito do pleno respeito e cumprimento dos direitos dos Povos Indígenas consagrados em instrumentos internacionais com ênfase nos direitos econômicos, sociais, culturais, direitos políticos e ambientais dos povos, comunidades e organizações indígenas.
5. Definições estratégicas do FILAC
De acordo com o resultado da Conferência Mundial sobre Povos Indígenas realizada em 2014, que reconheceu grandes desafios na área dos direitos dos povos indígenas, bem como a necessidade de promover a realização da interculturalidade nas políticas públicas, o FILAC iniciou um processo de ajustes conceituais e operacionais que incluiu a revisão das definições da missão e visão da instituição[16].
A missão define a razão de ser do organismo; a visão refere-se à visão de si mesma como um órgão, apontando para onde está indo a longo prazo, e o que deve se tornar para atender às necessidades e as demandas da população que reivindica para servir num contexto e um mundo em mudança, que impõe novas necessidades e expetativa à população e ao meio ambiente.
As seguintes definições estratégicas são então estabelecidas:
A missão do FILAC significa:
Promover a boa vida[17] como alternativa a uma vida digna para os povos, nacionalidades e comunidades indígenas da América Latina e do Caribe, através do pleno exercício dos direitos humanos e coletivos, e a interculturalidade como forma de coexistência, gerando oportunidades iguais e superando todas as formas de exclusão e dominação, desenvolvendo capacidades para facilitar, fornecer aconselhamento técnico e político sobre os processos de diálogo entre Estados e governos dos povos indígenas.
A Visão de FILAC significa:
Povos indígenas reconhecidos e respeitados no pleno exercício dos seus direitos, culturas e identidades, com organizações fortes, fortalecidos nas suas capacidades administrativas, técnicas e econômicas, através dos seus próprios processos de desenvolvimento sustentável que, na convivência intercultural, incorporaram as suas identidades ao desenvolvimento econômico e democrático e à gestão dos Estados nacionais da América Latina[18].
Para realizar a sua missão e visão da instituição, o FILAC tem os seguintes princípios de ação:
Diversidade étnica e respeito pela identidade cultural como fundamento da autodeterminação dos Povos Indígenas e o direito à autoidentificação.
Respeito pela tradição indígena baseada no reconhecimento das formas ancestrais, harmoniosas e sensíveis de associação com a natureza e a relação com o território da terra e do território da comunidade.
O gozo pelos Povos Indígenas dos benefícios previstos nos direitos gerais da cidadania multicultural, sem discriminação e em condições que permitam o seu livre exercício e gozo, a fim de reverter situações históricas de exclusão, buscando alcançar níveis satisfatórios de desenvolvimento com identidade nos próximos anos.
O Pleno respeito pelos direitos humanos, econômicos, sociais e culturais dos Povos Indígenas.
O reconhecimento da diversidade dos Povos Indígenas – rurais e urbanos- como um valor social que deve ser considerado um elemento essencial do desenvolvimento diante dos novos riscos e desafios dos processos da globalização.
A necessidade de que as formas ancestrais de coexistência, associação e organização dos Povos Indígenas sejam consideradas e integradas nos quadros jurídicos dos Estados-Membros.
Assumir a integralidade, a complementaridade, a reciprocidade, a interculturalidade, a consulta, o consenso e a conciliação como valores dos Povos Indígenas que devem orientar as políticas e atividades do FILAC.
Assegurar que a coordenação entre Povos Indígenas, Estados e agências de cooperação internacional seja um componente essencial do planeamento e da ação do FILAC.
6. Diretrizes estratégicas para o período
O desenho, a priorização, o direcionamento e a implementação das operações e ações do FILAC no período de julho de 2017 a junho de 2027, seguirão as seguintes orientações e diretrizes:
- Abordagem de direitos. De acordo com uma abordagem baseada em direitos, as políticas, planos, os programas e as outras iniciativas que o FILAC projeta e implementa devem buscar o objetivo final de contribuir para a realização dos direitos dos povos indígenas, conforme consagrado na Convenção 169 da OIT, a Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas, e outros instrumentos e mecanismos de direitos humanos, recolhidos de diferentes formas e em diferentes profundidades, a nível constitucional e legal, no sistema legal da maioria dos Estados membros do Fundo Indígena. Assim, o trabalho do FILAC terá como objetivo fortalecer a capacidade dos povos indígenas como detentores de tais direitos, reivindicá-los e exercê-los, e dos Estados como detentores de deveres, de cumprir sua obrigação de proteger, respeitar e promover os direitos dos povos indígenas.
- A escala regional e sub-regional dos processos de negócios. O FILAC promoverá, facilitará e implementará, conforme apropriado, iniciativas cujos impactos e resultados tenham expressão e influência nos campos espacial, político-administrativo e cultural regional, compreendidos como englobando todos os países membros do FILAC; Sub-regional, correspondente às áreas que compõem a sub-região mesoamericana, compreendendo o México, a Guatemala, o Salvador, Honduras, a Nicarágua, o Panamá e a Costa Rica; a Sub-região do Caribe, composta por o Belize e Cuba; a Sub-região amazônica, composta pela Venezuela, a Colômbia e o Brasil; a Sub-região andina, composta pelo Equador, o Peru e a Bolívia; e a sub-região do Cone Sul, composta pelo Chile, a Argentina, o Paraguai e o Uruguai.
- Oportunidade e relevância ao considerar cenários e contextos nacionais. Embora o FILAC concentre os seus recursos e esforços na revitalização dos processos regionais e sub-regionais, espera-se que eles gerem condições, acordos e compromissos que permitam o impacto e a implementação no nível do país, coletando e contabilizando as singularidades das realidades, agendas, temporalidades e condições em que os processos nacionais são desenvolvidos.
- Jovens e mulheres como grupos de foco prioritário. Isso implica mecanismos e condições específicos para garantir a participação e a inclusão prioritária das mulheres e jovens indígenas, bem como resultados expressos na situação de acesso e exercício dos direitos nessas populações e assuntos prioritários, que devem ser expressos na declaração e no conteúdo dos respetivos resultados e indicadores. Além disso, o FILAC promoverá iniciativas específicas destinadas à proteção, promoção, exercício e gozo dos seus direitos por parte desses grupos prioritários.
Cooperação e trabalho conjunto entre os atores do FILAC. Concertação para a construção de acordos e compromissos entre os atores do FILAC, para a conceção, promoção e gestão conjunta da agenda de temas de interesse comum.
6.1. Agenda de mudanças estratégicas do FILAC
Uma análise adequada do que foi feito pelo FILAC em 25 anos de existência, a fim de se fortalecer no futuro, deve ser baseada no reconhecimento dos principais pontos fortes que merecem ser enfatizados para aumentar a capacidade de obtenção dos resultados propostos.
Esse ajuste corresponde a uma perspetiva estratégica, ou seja, à procura das mudanças internas que permitam impactos externos sobre as questões centrais da ação institucional.
Nessas linhas, a paridade institucional é um aspeto fundamental. No FILAC, cada país participa dos órgãos reguladores por meio dum delegado indígena e um delegado do governo, devidamente credenciado por meio do Ministério das Relações Exteriores. Ambos representantes têm direitos e obrigações iguais em todos os espaços promovidos pelo FILAC. Essa modalidade organizacional constitui em si mesmo um modelo de consulta, geração de diálogo e formação de consenso participativo para a adoção de políticas de desenvolvimento indígena.
Esta caraterística especial facilitou a convocação de processos de consulta com os outros atores do desenvolvimento indígena: a comunidade internacional, o setor acadêmico e o negócio, entre outros.
Assim, consolidou um modelo de trabalho baseado na participação protagônica dos Povos Indígenas, construindo pontes para parceria e alianças estratégicas com outros atores num diálogo orientado à ação, para mudar e transformar como uma alternativa viável à crise global[19]. Neste momento não se conhece um exemplo institucional semelhante, pelo menos na região americana e caribenha, o que é um dado altamente relevante.
Esta força não só deve ser mantida, mas merece ser aprofundada.
Nesse sentido, parece haver pelo menos duas maneiras de alcançar esse objetivo: Por um lado, em relação aos povos indígenas, o FILAC tem muito a desenvolver em termos da sua capacidade de diálogo com eles. A representação institucional que tem obviamente não exalta todo o espetro rico e variado de povos e comunidades da região, mas ao mesmo tempo é uma forma extraordinariamente qualificada de permitir a expansão dos laços.
Por isso, parece oportuno conceber a possibilidade de construir a partir do FILAC uma área permanente, provavelmente estruturada por sub-regiões, para ouvir e conhecer a visão das diferentes vozes das organizações, comunidades e povos originários da América Latina e do Caribe.
Por outro lado, o FILAC está na melhor posição para desenvolver ainda mais essa capacidade de promover o encontro e o diálogo entre atores relevantes da sociedade na região que, duma forma ou de outra, têm a ver com a construção dum conjunto intercultural.
Assim, num futuro próximo, o planeamento deverá dar prioridade a este aspeto, prevendo o desenvolvimento de ações para debater questões nacionais e regionais importantes, com a participação de especialistas, representantes do governo e dirigentes indígenas e sociais que facilitem a obtenção de perspetivas coerentes para enfrentar os desafios que enfrentam.
Mas para efeitos dos ajustamentos no planeamento, estes aspetos devem ser realizados com o objetivo de atender a dois elementos necessários na estratégia futura: a produção de resultados concretos e a procura de alcançar impactos relevantes na sociedade da região.
Figura 1. Mudanças propostas nas abordagens e ênfase do trabalho do FILAC para o período
No primeiro aspeto, o planeamento deve ser organizado com base na conceitualização conhecida como Gestão Baseada em Resultados, um método ou estratégia de gestão cujo objetivo é alcançar o melhor desempenho e resultados demonstráveis. Este método tem uma visão sistêmica dos três principais processos do ciclo do projeto: planeamento, monitoramento e avaliação. No caso dos processos de formação e capacitação, é um eixo metodológico fundamental para orientar a aprendizagem num quadro de aplicação e utilidade concretas.
Os impactos das políticas e programas são determinados por muitos fatores. Alguns são controláveis a partir dum programa, mas outros não são. Por isso, embora os programas do FILAC não possam ser responsáveis por alcançar impactos, se estiverem em termos de trabalho e “gerenciamento de impactos”, contribuindo para a sua realização. Porque, em suma, tudo o que é feito tem por objetivo gerar mudanças sociais, que obviamente dependem duma coleção de fatores que não são manejáveis pela instituição, mas que ainda é o resultado final desejado. A este respeito, é necessário definir, o mais precisamente possível, o tipo de impactos a atingir, a área em que pode ocorrer e, naturalmente, a estratégia para consegui-lo.
6.2. Objetivo e resultados chaves a serem alcançados
O Fundo para o Desenvolvimento dos Povos Indígenas da América Latina e do Caribe (FILAC) por mais de duas décadas tem promovido o debate nos Estados–Membros das Nações Unidas para mudar o paradigma do desenvolvimento e retomar o legado da sabedoria ancestral do Bom Viver as uma alternativa para assegurar a sustentabilidade ambiental e o respeito pelos direitos fundamentais do ser humano.
O FILAC é um cenário de diálogo entre os principais atores do desenvolvimento indígena: Povos Indígenas, governos, sociedade civil, universidades, com eles, criou vários fóruns de consulta e de defesa com a convicção de que chegou o momento de se virar para um futuro com equidade, dignidade e solidariedade humana, de ouvir aqueles que enfrentaram e suportaram os problemas e nunca foram consultados. Neste contexto, e num esforço que muitas vezes não se destaca, conseguiu contribuir para a adoção de instrumentos internacionais e nacionais para a defesa e promoção dos direitos coletivos dos Povos Indígenas.
Este conceito baseia-se em normas internacionais que estabelecem o paradigma de que todos os povos contribuem para a diversidade e a riqueza das civilizações e, por isso, é necessário respeitar e promover os direitos intrínsecos dos povos indígenas, que derivam das suas estruturas e culturas políticas, económicas e sociais, das suas tradições espirituais, da sua história e da sua filosofia, especialmente dos direitos às suas terras, territórios e recursos.
É por isso que os tratados, os acordos e outros arranjos construtivos, bem como as relações que representam, servem de base para o fortalecimento da parceria entre os povos indígenas e os Estados. Nessa linha, instrumentos como a Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas promovem relações harmoniosas e cooperativas entre os Estados e os povos indígenas, baseadas nos princípios da justiça, da democracia, do respeito pelos direitos humanos, da não discriminação e da boa fé[20].
Em outras palavras, a missão e a visão do FILAC podem ser entendidas como um esforço regional por parte dos Estados e dos povos indígenas para implementar efetivamente as disposições dos instrumentos internacionais de direitos humanos, tanto universais como regionais[21]. Mas além do mandato institucional e regulamentar, a construção de relações de paridade constitui um pré-requisito para o sucesso das políticas públicas a nível nacional e ainda mais das que exigem a implementação transfronteiras, como é o caso das políticas ambientais.
A promoção do desenvolvimento com a identidade e o diálogo intercultural são requisitos essenciais para avançar com soluções reais e sustentáveis numa ampla variedade de temas, desde a proteção ecológica e natural dos recursos, o desenvolvimento agrário até as políticas culturais, sociais e educacionais, bem como sistemas de justiça e resolução de conflitos, para mencionar alguns problemas.
Figura 2. Síntese das áreas de intervenção do FILAC
Como resultado da sua natureza e mandato, o principal objetivo da organização é alcançar Relações iguais entre Estados – Povos Indígenas para o cumprimento de direitos e interculturalidade.
Como pode ser visto na figura acima, para o FILAC há duas áreas de intervenção necessárias: o Estado e os povos indígenas. No primeiro caso, melhorar os seus quadros normativos e adaptar as suas instituições e políticas públicas aos efeitos que elas podem garantir, proteger e promover o exercício dos direitos dos povos indígenas. No segundo caso, dar aos povos capacidade suficiente para a ação e proposta para o exercício dos mesmos direitos.
Vinculado a esse objetivo orientador, o FILAC visa, neste novo ciclo que começa, alcançar os seguintes resultados principais:
- A construção de acordos e compromissos relevantes entre povos indígenas e Estados
- Apoiar o desenvolvimento dum novo paradigma de desenvolvimento econômico com identidade
- Fortalecer as capacidades para influenciar e exercer os direitos indígenas
6.3. Mapa Estratégico e Cadeia de valores do FILAC para 2027
As ações, a gestão, os investimentos e, em geral, as iniciativas desenvolvidas pelo FILAC no cumprimento do seu mandato serão organizadas de acordo com as seguintes orientações e diretrizes gerais:
A) áreas ou linhas do Programa: Para alcançar os seus objetivos, o FILAC organizará as suas operações em três áreas ou linhas do programa:
-
- O Programa de diálogo e concertação: que promove e apoia os processos de diálogo nacionais e internacionais, cujo objetivo é construir acordos e compromissos para a definição, adoção e implementação de políticas públicas que procuram o reconhecimento, a proteção e o exercício efetivo dos direitos individuais e coletivos dos povos indígenas.
- O Programa de Desenvolvimento Econômico com identidade, para a elaboração e implementação de processos e iniciativas para promover o desenvolvimento com identidade focada na Boa Vida – o Bom – Viver dos Povos Indígenas, de acordo com o reconhecimento, a proteção e a promoção do exercício dos direitos económicos, sociais, culturais, políticos e ambientais dos povos, comunidades e organizações indígenas.
- O programa de Educação para a Equidade, que apoiará processos e iniciativas para fortalecer as capacidades dos homens, mulheres e jovens para influenciar no reconhecimento, na transformação e na criação de condições para o exercício efetivo e gozo dos direitos individuais e coletivos dos Povos Indígenas; promovendo os processos de formação, investigação, sistematização e difusão de conhecimentos, saberes e tecnologias próprias, desde epistemologias e metodologias interculturais e próprias dos povos indígenas, através do diálogo horizontal de conhecimentos e saberes.
B) Orientação aos resultados: as operações do FILAC terão como objetivo e serão avaliadas quanto aos resultados mensuráveis, através de meios de verificação confiáveis, que foram definidos em cada uma das áreas do programa
C) impacto: uma parte significativa das ações, gestões e investimentos que o FILAC realizará será destinada a gerar impactos, tanto internacional quanto nacional, expressos na capacidade de criar condições favoráveis para a incorporação de temas e questões de interesse aos Povos Indígenas nessas áreas, e, em especial, nas instituições e políticas públicas dos Estados–Membros, no que se refere ao reconhecimento, à proteção e ao exercício dos seus direitos. Assim, espera-se que o trabalho do FILAC, em vez de contribuir de forma subsidiária para a obtenção de resultados nessas áreas por meio de intervenções diretas e direcionadas, contribua para impactos mais amplos que são expressos na adoção de políticas amplamente aplicáveis.
Nessas áreas, a organização focará o seu apoio num portfólio de projetos selecionados, apoiando a sua implementação por meio de processos internos e serviços relacionados, organizados numa “cadeia de valor” destinada a afetar as mulheres e jovens indígenas como prioridade. Este último, definido como pública chave da organização.
Para lograr isso, a organização será desafiada a gerenciar o seu posicionamento e relacionamento com os principais públicos mencionados e outros atores na sua rede de relacionamentos. Além disso, deve assegurar processos e capacidades que lhe permitam construir conhecimentos e prestar apoio técnico e político aos projetos que irá apoiar.
Isso exigirá a geração e a administração da disponibilidade de recursos financeiros para contribuir com os projetos selecionados e com os necessários para a própria operação da organização.
Os compromissos e desafios acima mencionados para este novo ciclo institucional exigirão, assim, o desenvolvimento estratégico e organizacional do FILAC, desafio de evolução ou transformação que tem sido abordado por meio de iniciativas como a reengenharia em que a organização tem trabalhado nos últimos anos.
Para isso, deve ser promovido um trabalho coordenado ou, se for caso disso, iniciado em parceria com os atores globais e regionais relevantes, como o Fórum Permanente sobre as Questões Indígenas Das Nações Unidas, em particular com os seus membros que vem dos países do continente, bem como da organização Transparência Internacional e, em geral, com outras áreas importantes da comunidade Ibero-americana[22].
A Figura 3 tenta sintetizar a narrativa estratégica acima, descrevendo como a organização espera criar valor e avançar em direção à sua visão, executando sua missão institucional com foco num conjunto reduzido de compromissos e desafios de desempenho chave para a organização. Este diagrama, chamado “Mapa Estratégico”, é usado por várias instituições públicas e privadas como uma ferramenta para apoiar a governança e a gestão, promovendo, entre outras, o alinhamento e a aprendizagem organizacional em torno dum quadro de referência compartilhado entre todos aqueles que o compõem.
Figura 3. Mapa Estratégico FILAC a 202
Como pode se ver, a área central do diagrama reforça em amarelo as principais áreas de gestão em que a organização espera trabalhar, a fim de cumprir os seus compromissos e promessas de resultados e impactos nos seus grupos prioritários, alcançar o seu posicionamento desejado e, por fim, contribuir para o propósito mais alto. Estas colunas são doravante designadas “Programas emblemáticos”.
Os programas mencionam os desafios institucionais prioritários relacionados aos processos e serviços internos da organização, bem como os seus intangíveis. Todos eles serão chamados doravante de “Eixos Estratégicos”.
6.4. Rede FILAC de relacionamentos e função de articulação
O FILAC pretende se tornar um mecanismo de apoio aos processos de autodesenvolvimento dos povos, comunidades e organizações indígenas da América Latina e do Caribe. A natureza, a estrutura e o tema do FILAC significam que a sua própria existência é marcada por uma ampla gama de contatos e relações tanto a nível nacional como internacional. Composta por representação governamental e social (indígena), mas também constituída como pessoa jurídica internacional, a instituição só pode existir se realizar uma tarefa ampla de relações nacionais e internacionais.
Nesse contexto, o FILAC não só precisa manter relações com vários parceiros nacionais, regionais e até globais, mas, para atingir os seus objetivos, também é membro de vários sistemas institucionais.
Isto não é apenas uma consequência dum posicionamento institucional, mas é necessário para um cumprimento adequado das suas responsabilidades e objetivos. Assim, por exemplo, a promoção de ações relevantes para fortalecer o autodesenvolvimento e a realização dos direitos coletivos dos povos indígenas requer múltiplas ações que, por a sua vez, envolvem atores nacionais, regionais e globais.
Além disso, deve-se ter em mente que as caraterísticas de paridade do FILAC significam que a sua presença em várias áreas em nenhum caso constitui a repetição ou menos concorrência com o papel desempenhado por outros atores, como os mesmos Estados ou organizações indígenas. A sua voz e visão são diferentes, com uma perspetiva que contribui e se especializa no desenvolvimento de relações sociais com a equidade cultural.
Como consequência, uma adequada caracterização dos principais interlocutores dentro e fora dos Estados é um aspeto essencial para o trabalho do FILAC. Determinar com a maior precisão possível com quem se mantêm e alimentam relações, os seus conteúdos e alcances, é um aspeto chave no funcionamento institucional.
Nesse sentido, sem pretender esgotar o ponto que, além disso, por a sua própria natureza é dinâmico e mutável, podemos identificar três grandes áreas de relacionamento ou influência da ação do FILAC: Estados, através dos seus governos ou outras instituições, os povos indígenas através das suas organizações nacionais e regionais e da comunidade internacional, incluindo relações com organizações internacionais, agências de cooperação e outras que possam ser relevantes para o trabalho do FILAC.
Atualmente, o FILAC está desenvolvendo uma ampla gama de vínculos institucionais, e é por isso que, ao analisar estratégias e planeamento, é um aspeto de grande importância que deve ser priorizado em termos de organização e busca de resultados.
A figura seguinte propõe uma descrição para a rede potencial de relacionamentos na que o FILAC participa.
Figura 4. Rede de relações envolvidas no trabalho do FILAC
Sem prejuízo do foco tradicional do FILAC nas três áreas de relacionamento acima mencionadas, mais de vinte anos de trabalho institucional, o campo potencial das relações tem evoluído para uma maior complexidade devido à variedade de atores e à multiplicidade de tendências[23] envolvidas no caminho para o desenvolvimento com identidade.
Participar dessa rede de relações implica então viver com uma diversidade de identidades e objetivos, ao mesmo tempo de inter-relações explícitas ou implícitas que geram a necessidade de colaborar em torno de objetivos compartilhados e lidar de forma colaborativa com desafios e oportunidades emergentes. De fato, no campo tradicional de ação o FILAC (relações entre Estados e Povos Indígenas), nos últimos anos, houve maiores tensões e perigo de estagnação nos direitos conquistados nos anos recentes.
O FILAC, por a sua natureza e o seu mandato, é então chamado a desempenhar um papel de coordenação e facilitação na reunião e “co defesa” entre os atores envolvidos no desenvolvimento da identidade. Ou seja, facilitar o desenvolvimento de objetivos compartilhados de criação de valor, como:
- Capacitação dos atores envolvidos na rede.
- Construir relações de confiança e colaboração entre os participantes.
- Desenvolver o conhecimento de identidades e inter-relacionamentos.
- Conquistar e exercer direitos e deveres.
7. Programas emblemáticos e Eixos estratégicos
7.1. As linhas dos programas e/ou programas emblemáticos
A fim de atingir os objetivos acima enunciados, o FILAC organizará as suas operações com base na conceção e implementação de três programas principais e/ou linhas de programas: o Programa de diálogo e concertação; o Programa de Desenvolvimento Econômico com identidade; e o Programa de Educação para a Equidade.
A conformação destas três linhas principais do programa foram moldadas pela necessidade de organizar e desenvolver com a maior eficiência possível as ações que o FILAC vem realizando, promovendo ajustes que possibilitem a obtenção de melhores resultados.
Tanto os programas de referência como os programas que podem ser desenvolvidos não devem ser compartimentos estanques, mas sim interligados, para os quais serão tomadas as medidas de gestão e coordenação necessárias.
Em todos os casos, serão temas transversais permanentes: a perspetiva de gênero e a perspetiva intergeracional, já que tanto as mulheres quanto os jovens são prioridades para o FILAC.
Outro lineamento que pode ser aplicado de forma transversal às operações destinadas a implementar os programas de referência é o aprofundamento da utilização sistemática das tecnologias da informação e da comunicação e a estruturação duma oferta programática que possa ser acessível através dos meios tecnológicos agora amplamente disponíveis.
7.1.1. Programa de Diálogo e Concertação
O Programa de Diálogo e Concertação promoverá e, se for caso disso, aprofundará os processos de diálogo nacionais e internacionais destinados a definir, construir e implementar políticas públicas de relações de paridade, coerentes com o reconhecimento e a proteção dos direitos individuais e coletivos dos povos indígenas.
7.1.2. O Programa de Desenvolvimento Econômico com identidade
O Programa de Desenvolvimento Econômico com identidade apoiará o desenho e a implementação de processos e iniciativas que promovam o desenvolvimento com identidade focada na Boa Vida – no Bom Viver dos Povos Indígenas, de acordo com o reconhecimento e a proteção dos direitos econômicos, sociais, culturais, políticos e ambientais dos povos, comunidades e organizações indígenas.
7.1.3. O Programa de Educação para a Equidade
O Programa de Educação para a Equidade promoverá a formação, a investigação, a construção, a sistematização e a divulgação de conhecimentos, saberes e tecnologias próprias dos homens e das mulheres indígenas, desde epistemologias e metodologias ancestrais e interculturais através do diálogo horizontal de conhecimentos e saberes. Procurará também influenciar as instituições estatais, para a produção de conhecimento em condições iguais para a transformação dos Estados, ou seja, para produzir conhecimento para a interculturalidade.
7.2. Eixos Estratégicos
Paralelamente e inter-relacionado com os principais programas, o FILAC executará uma série de ações que chamamos de Eixos Estratégicos. Trata-se de tarefas institucionais prioritárias que funcionam como coluna vertebral no trabalho quotidiano e que permitem a implementação dos principais programas e, em geral, das tarefas relacionadas com o mandato do FILAC.
Há três eixos: o posicionamento institucional do FILAC; a assistência técnica e o treinamento político; o financiamento de programas e projetos.
7.2.1. Posicionamento institucional do FILAC
Com relação à posição do FILAC em relação com os outros atores nacionais e internacionais, o foco é fortalecer e consolidar a sua posição como ponto de referência essencial em relação às questões que aborda. Isso é entendido como um requisito necessário para aprofundar as abordagens e os diálogos interinstitucionais, o que deve implicar um melhor impacto nas ações dos intervenientes.
Um aspeto importante da consolidação da posição do FILAC está associado à transparência no seu gerenciamento e à responsabilidade regular.
Perante qualquer eventual questionamento da utilização dos fundos ou dos critérios para a adoção de certas decisões, é essencial tornar claro, desde o início dos processos, os mecanismos utilizados, disponibilizando as informações relevantes e substanciais às partes interessadas. Além de ser um critério de boa administração, a transparência é considerada um instrumento de alto valor político que concede solidez institucional e permite posicionar-se em diálogo a partir dum lugar preferencial.
Outro aspeto necessário para fortalecer e consolidar o posicionamento institucional é a visibilidade adequada do FILAC, que contribui para a construção duma imagem institucional funcional para os objetivos prosseguidos.
Tanto para a transparência da gestão como para a visibilidade institucional, os mecanismos de comunicação internos e externos devem ser melhorados através dum Gabinete de Informação melhorado para este fim.
Com estes elementos, bem como outras iniciativas acima mencionadas, tais como fóruns regionais para as relações com povos indígenas, Estados e outros atores relevantes, e a implementação dos principais programas, o FILAC revisará a sua estratégia de relações internacionais para permitir que ela tenha maior impacto em vários órgãos em que esteja interessada de participar.
7.2.2. Desenvolvimento da assistência técnica e da formação política
Um segundo foco estratégico será o desenvolvimento de assistência técnica e treinamento político para os membros e intervenientes do FILAC.
Em coordenação e interação com os principais programas, este eixo tem por objetivo fornecer aconselhamento na formulação de políticas públicas inclusivas e interculturais, prestar assistência técnica à geração de informação técnica especializada que, em muitos casos, nem os espaços académicos nem as instituições estatais atendem.
Destina-se igualmente a prestar assistência técnica e formação no domínio da análise e da articulação política, que são tão importantes para o avanço das políticas de diálogo social e de concertação. A criação dum observatório sobre o exercício dos direitos individuais e coletivos dos povos indígenas é um dos objetivos a alcançar através da implementação deste eixo estratégico.
7.2.3. Geração de financiamento de projetos e os programas empresariais
O terceiro eixo estratégico tem a ver com a geração de financiamento de projetos e com os principais programas do FILAC. Por mandato institucional, este é um aspeto indispensável, mas também essencial, não só para assegurar o seu próprio funcionamento, mas também para satisfazer as exigências das organizações indígenas que solicitam apoio ao seu autodesenvolvimento.
O eixo envolve pelo menos três aspetos: a elaboração duma carteira de projetos, o trabalho na obtenção de recursos para o seu financiamento e a administração de recursos que, tal como acima referido, cumprirão todos os requisitos relevantes de transparência e prestação de contas em conformidade.
7.2.4. O financiamento das operações do FILAC
A Convenção Constitutivo do FILAC (Madri, 1992) estabeleceu, no artigo 2.º, uma ampla gama de formas de integração do patrimônio institucional e do financiamento das suas operações, sem adotar uma forma obrigatória de contribuição dos Estados–Membros. Permitiu também a possibilidade de obter recursos de outros Estados que não eram membros do Fundo Indígena e de outras entidades de cooperação, com base na assinatura de convênios ou acordos específicos (artigo 5.º).
A formulação acima referida representou o nível de consenso alcançado na negociação prévia do texto da Convenção entre os representantes dos Estados. Considerou, por um lado, os inconvenientes do sistema de financiamento das organizações internacionais através de quotas obrigatórias na altura; e de outro, a conveniência de facilitar o interior dos países a ratificação da Convenção, independentemente de eventuais implicações financeiras imediatas.
Cinco anos mais tarde, a II Assembleia Geral (La Paz, 1977) decidiu autorizar o estabelecimento dum capital social, formado com contribuições dos Estados membros do Fundo, de outros Estados e de agências multilaterais de cooperação, cujos retornos são utilizados para atividades substantivas em apoio aos povos e comunidades indígenas, e os custos operacionais e operacionais da agência. Aprovou o estabelecimento duma confiança para receber tais contribuições, instruída a concordar com o Banco Interamericano de Desenvolvimento na sua administração inicial, e instruiu o Conselho de Administração e a Secretaria Técnica a gerenciar e implementar as promessas para atingir capital suficiente, estimado em cem milhões de dólares (Resolução nº 2).
A adoção desta estratégia –conhecida como capitalização– teve em conta o facto de, até essa data, 17 países terem ratificado a Convenção e manifestado a sua vontade de encontrar formas de contribuir para o financiamento das suas operações; e que as operações do FILAC devem tomar a forma de ações que criam condições para mobilizar (alavancar) o financiamento de políticas, programas e projetos de desenvolvimento indígena dentro dos países e a nível regional, ou seja, facilitar os pré investimentos; para isso, precisava dum fluxo dos seus próprios recursos que o permitisse contribuir para melhorar a posição dos indígenas em atrair recursos de várias fontes e gerenciar uma agenda de desenvolvimento com identidade. Também foi observado que, nesses anos, as carteiras internacionais de crédito de vários Estados membros do FILAC tinham saldos não utilizados que poderiam ser direcionados para o cumprimento dos seus compromissos de fornecimento.
No entanto, a II Resolução da Assembleia recomendou o processamento dum instrumento de contribuição “que consiste numa Carta de intenção depositada junto ao Banco Interamericano de Desenvolvimento, no qual a sua determinação em efetuar uma transferência para o fundo fiduciário , o montante total do mesmo, o período em que será pago e, se aplicável, o tipo de apoio que solicita ao BID para facilitar a sua contribuição”. Tal instrumento não foi desenvolvido, as contribuições para a confiança foram feitas como doações voluntárias e compromissos como uma mera intenção de boa vontade. A falta de tal instrumento dificultou o processo de contribuições dentro dos países e o planeamento com certeza do crescimento do fundo social e sua gestão como carteira de investimentos.
Nestas condições, durante a primeira década de gestão do FILAC, foram assumidos compromissos –não formalizados– de cerca de 35 milhões de dólares e pouco mais da metade desse montante foi elevado. Nos anos seguintes, a gestão de recursos novos ou comprometidos perdeu força por parte da Secretaria Técnica, enfrentou condições menos favoráveis nas economias dos países e quedas significativas na taxa de retorno do capital social. Assim que os esforços de gestão foram renovados, a receita aumentou, mas com o tempo as condições das economias nacionais mudaram e os compromissos de contribuir para a confiança, originalmente declarada pelos governos, desapareceram.
Os esforços de “relançamento” e “reengenharia” do FILAC não têm sido suficientemente focados na resolução da questão da sustentabilidade financeira a longo prazo. Foi dada prioridade à melhoria das taxas de retorno –dependente dum mercado em mutação– e à utilização de reservas de detenção de existências para apoiar o funcionamento dos órgãos do BCE e do Secretariado Técnico. A relevância do mecanismo de formação e manutenção do capital social alimentado por contribuições de países membros não foi avaliada, nem os instrumentos que facilitem o seu tratamento.
Nessas circunstâncias, a capacidade do FILAC de aproveitar recursos de outras fontes (nacionais e internacionais, públicas ou privadas) para projetos formulados e administrados por comunidades e povos indígenas foi reduzida, deve ser acomodada às agendas e interesses dos doadores.
Portanto, parte do desafio desta nova etapa é superar a situação atual que garantirá um financiamento sustentado ao longo do tempo.
7.2.5. Desenvolvimento estratégico e organizacional
Finalmente, o eixo de desenvolvimento estratégico e organizacional do FILAC está relacionado com os esforços atuais (reengenharia) e permanentes para otimizar os intangíveis da organização, necessários para a execução efetiva da estratégia e da operação institucional.
8. Estrutura e modelo de gestão
Num contexto de mudanças e ajustes, típicos da vida de qualquer instituição, a atual etapa do FILAC deve ser vista como uma oportunidade de revisar ações, coletar experiências, melhorar os aspetos mais positivos detetados e ajustar os elementos que merecem ser modificados, alcançar o seu objetivo final, que consiste na promoção da igualdade de relações entre Estados e Povos Indígenas no âmbito do pleno respeito e cumprimento dos direitos dos Povos Indígenas consagrados em instrumentos internacionais, com ênfase nos direitos econômicos, sociais, culturais, políticos e ambientais dos povos, comunidades e organizações indígenas[24].
As recentes resoluções adotadas pela Assembleia Geral do FILAC marcam o caminho da revisão, reafirmação e ajustamento institucional, pois recordam que em vinte e cinco anos de vida institucional “acumulou uma trajetória valiosa que permitiu que fosse chamado de ‘patrimônio dos povos e dos Estados da região’, que não é aconselhável esquecer, mas valorizar[25]“, mas isso, ao mesmo tempo, “… o novo contexto político-económico internacional dos Estados Partes estão considerando novas agendas que lhes permitam renovar os acordos entre os atores do desenvolvimento indígena e que esse desafio exige que a agência atualize o seu mandato, objeto e funções”[26].
Portanto, diante dos desafios internos e externos delineados neste documento, “…o Fundo para o Desenvolvimento dos Povos Indígenas da América Latina e do Caribe requer uma atualização dos seus processos de gestão para a tomada de decisões, otimizar o seu funcionamento e desenvolvimento de atividades no âmbito da participação democrática dos seus membros[27]”
Precisamente, o planeamento estratégico desenvolvido neste documento faz parte, reflete e pretende dar efeito às decisões que os órgãos reguladores e auxiliares do FILAC têm adotado no quadro do processo de relançamento e da reengenharia institucional.
Deve estar em sintonia com as novas realidades atuais que, por um lado, marcam notáveis avanços normativos a nível internacional e nacional, mas, ao mesmo tempo, apresentam o desafio da sua implementação efetiva, bem como a coerência adequada entre as políticas públicas dos Estados e o mandato legal e axiológico dos padrões normativos incorporados.
É importante notar que uma situação como a expressa e reconhecida institucionalmente gera uma espécie de encruzilhada que exige decisões urgentes: se a instituição não fizer grandes alterações, o risco de estagnação e, portanto, a perda de peso específica no concerto internacional aumentará. Se, por outro lado, forem feitos os ajustes e mudanças correspondentes, será possível enfrentar esse novo ciclo em melhores condições que permitam o crescimento em todos os aspetos.
O ponto de partida para o planeamento futuro é auspicioso, devido ao longo e frutuoso caminho institucional em que marcos institucionais de grande valor são claramente detetados tanto na promoção do diálogo social e da concertação, em termos de formação e educação, no apoio a iniciativas das comunidades e organizações indígenas, e o impacto direto do FILAC em cenários internacionais relevantes para o destino dos povos indígenas na região.
Assim, o processo de planeamento estratégico para o novo tempo visa essencialmente fazer mudanças que permitam ao FILAC fortalecer a sua posição e o seu impacto político, tornando-a mais eficiente no seu desempenho institucional, ajustando a sua estratégia, estrutura e modelo de gestão.
A estratégia institucional deverá basear-se em três programas emblemáticos e três eixos estratégicos de inter-relação e coordenação permanentes que permitam um diálogo intrainstitucional positivo e eficaz.
Tanto o modelo de gestão como todas as ações do FILAC serão orientados pelos critérios de transparência e responsabilidade que são entendidos como uma necessidade e um valor institucional favorável para o melhor posicionamento externo. Ao mesmo tempo, o planeamento deve ser organizado por meio dum gerenciamento baseado em resultados para obter melhor desempenho e resultados demonstráveis.
O modelo de gestão proposto baseia-se numa estrutura simples, com gestores de qualidade técnica demonstrável, que assegura, a partir da mesma organização de trabalho, a integração da perspetiva de género e inter-geracional em cada uma das ações da instituição, ao mesmo tempo que um processo de avaliação interna em curso que permite a realização dos ajustamentos e alterações necessários ao progresso dos programas e projetos em curso.
Para implementar tanto a estratégia quanto a cadeia de valor mencionada acima, o FILAC precisa ter uma estrutura e processos de diálogo e coordenação que permitam abordar, o necessário empoderamento e cooperação em equipes e indivíduos, bem como a interação adequada com o seu contexto e público chave.
De acordo com as diretrizes e os desafios institucionais descritos, será adotado um modelo de governança e gestão para organizar o diálogo e a coordenação dentro da instituição, com o objetivo de promover o desempenho, a capacidade de aprendizagem e a evolução organizacional no novo ciclo.
Tanto a estrutura quanto o modelo de governança e gerenciamento (Figura 5) proposto abaixo procuram atender aos seguintes atributos:
- Coerência com o propósito organizacional: relações iguais Estados – Povos indígenas
- Foco nos impactos sobre o público chave: a Mulher e a Juventude
- Interculturalidade
- Assegurar a sustentabilidade, a transparência e foco
- Promover a execução e a aprendizagem organizacional sistemática
- Facilitar a transversalidade e a complementaridade
- Favorecer o empoderamento e a cooperação das pessoas
- Melhorar a conectividade e a consciência da organização com o ambiente e a sua evolução
Figura 5. Modelo de governação e gestão do FILAC
A estrutura e funções propostas visam atender de forma simples e clara e com a menor quantidade de elementos possíveis a execução da estratégia e cadeia de valor organizacional.
Pretende-se assegurar que tanto a estrutura como o modelo de gestão facilitem o fluxo de informação, o alinhamento estratégico, a destreza operacional, a aprendizagem e a contínua retroalimentação interna e externa. Em outras palavras, favorecer a versatilidade organizacional para operar e prosperar em diferentes contextos.
Desta forma, o modelo de governança e gestão apresentado busca estabelecer espaços sistemáticos de diálogo, coordenação e retroalimentação através dos quais se discuta, se tomem decisões e se realize o seguimento em torno do propósito e rol, a estratégia e a operação da organização. Estes espaços de interação denominados “círculos de governança e gestão” complementam a estrutura para favorecer o empoderamento e a colaboração na organização, favorecendo uma visão transversal e apoio complementário entre as funções definidas pela estrutura.
[1] X AG Res 1/2012
[2] X AG Res 3/2012
[3] O Seminario Novos desafios do FILAC para a nova Era (Panamá, setembro de 2013) e a consulta com conselheiros eminentes permanentes (Quito, outubro de 2013) forneceram dados fundamentais para a preparação dum primeiro documento de linhas de orientação do relançamento estratégico, estes são exemplos deste ciclo de atividades e trabalho.
[4] Como exemplo, pode-se observar que em 15 dos 22 Estados membros o FILAC, a Convenção 169 da OIT (incluindo a Espanha) está em vigor; e que a Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas foi adotada com os votos dos Estados membros do FILAC.
[5] Os conteúdos desta seção foram retirados da exposição da Dra. Mirna Cunningham, por ocasião do Seminário de Planeamento Estratégico do Conselho de Administração, realizado em Santiago, no Chile, no 12 de maio de 2017; e os comentários, as observações e, em geral, as contribuições dos vereadores presentes nesta atividade.
[6] Um participante do Seminário de Planeamento Estratégico fez a pergunta “Como é a conservação respeitando os direitos indígenas?”.
[7] A criação do Fórum Permanente das Nações Unidas sobre Povos Indígenas em 2000, a adoção, em 2007, da Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas, a nomeação de um Relator Especial das Nações Unidas para Assuntos Indígenas, por exemplo.
[8] Durante o Seminário de Planeamento Estratégico, observa-se que territórios indígenas abrigam os recursos naturais (Água, petróleo, florestas, minerais) da América Latina.
[9] Durante o referido Seminário de Planeamento Estratégico, também se observam mudanças nas formas de participação política, com o nascimento de novos partidos políticos, novas alianças e formas de participação. A preocupação também é expressa sobre a tendência de novos jovens líderes, que tendem a se deslocar e não considerar os líderes tradicionais. Nesse sentido, destaca-se que o FILAC deve ser uma organização de treinamento para os novos líderes no nível regional. Além disso, afirma-se que é necessário considerar o potencial que as novas tecnologias nos oferecem para intensificar e expandir o fluxo de informação, a criação e a gestão de redes de ação amplas.
[10] CELADE/CEPAL (2014). Os Povos Indígenas na América Latina. Progresso na última década e desafios para a garantia dos seus direitos. CEPAL.
[11] documento “Estado de progresso na implementação da reengenharia do FILAC no 11 de agosto de 2016”. Veja também o documento da reunião conjunta das comissões de reengenharia e regulamentação ao FILAC realizada em Bogotá, na Colômbia, os dias 3 e 4 de agosto de 2016.
[12] Até à data, 22 Estados–Membros assinaram e ratificaram a sua Convenção constituinte: a Argentina, a Bélgica, o Belize, a Bolívia, o Brasil, o Chile, a Colômbia, a Costa Rica, Cuba, o Equador, o Salvador, a Espanha, a Guatemala, Honduras, o México, a Nicarágua, o Panamá, o Paraguai, o Peru, o Portugal, o Uruguai e a Venezuela. A sua Convenção é depositada junto do Secretariado-Geral das Nações Unidas e está aberta à adesão de qualquer Estado que se identifique com os seus princípios e finalidades.
[13] FILAC, XIII Assembleia Geral – sessão extraordinária, Bogotá, na Colômbia, nos dias 17 e 18 de outubro de 2016
[14] De acordo com o texto aprovado na Resolução XIII AG/FILAC/002 sobre Interpretação complementar de aspetos de conteúdo dos artigos no acordo constitutivo e outras disposições gerais, XIII Assembleia Geral, Outubro de 2016.
[15] Resolução XIII AG/FILAC/002 citada.
[16] FILAC, Conjunta das comissões de reengenharia e regulamentação do FILAC, Bogotá, agosto de 2016.
[17] é uma proposta alternativa ao conceito dominante de desenvolvimento nascido do mundo indígena que, embora ainda em construção e com receção diferente de acordo com a realidade de cada sociedade, está provocando a re-discussão de muitos conceitos.
[18] De acordo com o Relatório Anual da XI Assembleia do FILAC, novembro de 2013
[19] FILAC, XI Assembleia Geral, sessão especial, Relatório Anual 2013
[20] ONU, 61/295, Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos povos indígenas, Preâmbulo, 13 de Setembro de 2007
[21] Conteúdo semelhante pode ser visto em AG/RES. 2888 (XLVI-O/16) Declaração Americana sobre os Direitos dos Povos Indígenas, aprovada na segunda sessão plenária de 14 de junho de 2016.
[22] A Assembleia Geral Ordinária realizada em Bogotá nos dias 16 e 17 de julho de 2015 adotou o processo “Diretrizes para a Reengenharia do FILAC”, que foi posteriormente lançado pelo Conselho de Administração com o mandato dum desenvolvimento paralelo dos seus componentes estratégicos, operacionais e normativos (extraídos dos objetivos da reunião conjunta das comissões de reengenharia e regulamentação do FILAC realizada em Bogotá nos dias 3 e 4 de agosto de 2016).
[23] “Novos retos e desafios para o FILAC na Nova era” (XI Assembleia Geral, sessão especial)
[24] ver Resolução XIII AG/FILAC/002 citada acima
[25] Resolução XIII AG/FILAC/001
[26] Resolução XIII AG/FILAC/002
[27] Resolução XIII AG/FILAC/003